Maia diz que Eduardo Bolsonaro pode ser punido por aventar AI-5
Eduardo Bolsonaro chegou ao segundo mandato consecutivo de deputado federal batendo recorde de votos, graças à democracia. Mas, sempre que pode, exalta a ditadura. Pela segunda vez nesta semana, o líder da bancada do PSL, herdeiro do presidente Jair Bolsonaro e presidente da Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional apoiou medidas inconstitucionais, como um novo ato institucional número 5, o AI-5.
O ato institucional mais inglório do regime militar, de 1968, deu início aos anos de chumbo da ditadura militar brasileira e resultou no fechamento do Congresso Nacional e dos legislativos dos Estados e Municípios, permitiu a cassação de mandatos parlamentares, permitiu o presidente nomear interventores estaduais e municipais e suspendeu a concessão de habeas corpus pelo Judiciário.
Em entrevista à jornalista Leda Nagle, reproduzida nesta quinta-feira no canal dela no YouTube,
o deputado criticou os protestos no Chile, que duram semanas e
começaram após protestos contra a alta da passagem do metrô de Santiago e
desaguaram em atos contrários ao Governo de Sebástian Piñera.
“Vai chegar um momento em que a situação vai ser igual ao final dos
anos 60 no Brasil”, disse Eduardo. E completou: “Se a esquerda
radicalizar a esse ponto, a gente vai precisar ter uma resposta. E uma
resposta pode ser via um novo AI-5, pode ser via uma legislação aprovada
através de um plebiscito como ocorreu na Itália. Alguma resposta vai
ter que ser dada”.
A estratégia de lançar propostas ou
teses infundadas e depois voltar atrás é comum entre a família
Bolsonaro, que sempre tenta pautar o debate na imprensa ou desviar o
foco de atenção da mídia. Recentemente, o presidente fez algo semelhante
ao publicar em suas redes sociais um vídeo no qual ele era um velho
leão cercado por hienas, representadas pelo Supremo Tribunal Federal,
partidos políticos e órgãos de imprensa. Horas após a postagem, ele
retirou o conteúdo da internet. Na ocasião, o nome da família Bolsonaro
tinha voltado ao noticiário devido a áudios em que Fabrício Queiroz,
ex-assessor do hoje senador Flávio Bolsonaro, falava da divisão de
cargos na Câmara e no Senado e das investigações que pesam contra ele
próprio.
Nesta quinta-feira, o presidente lamentou o
comentário feito pelo seu filho. "Quem quer que seja que fale em AI-5,
está sonhando. Está sonhando! Não quero nem que dê notícia nesse sentido
aí", disse Bolsonaro ao ser questionado por jornalistas se concorda com
um novo ato institucional, conforme publicado pelo site G1.
Mesmo após a fala de seu pai, Eduardo insistiu na narrativa. Ele publicou em sua conta no Twitter um
vídeo no qual reforça que "nós não permitiremos" que a esquerda
proteste no Brasil como está protestando no Chile. Ainda citou um livro
escrito pelo coronel Carlos Brilhante Ustra, um reconhecido torturador
do regime militar brasileiro, no qual culpa a esquerda por o que ele
considera ser atos terroristas durante a ditadura.
Na tribuna da Câmara, na última terça-feira, ele já havia demonstrado seu culto à ditadura brasileira
e fez ameaças semelhantes. Na ocasião, também tratando dos protestos
chilenos, ele disse: “Não vamos deixar isso aí vir para cá. Se vier para
cá, vai ter que se ver com a polícia. E, se eles começarem a
radicalizar do lado de lá, a gente vai ver a história se repetir. Aí é
que eu quero ver como a banda vai tocar”.
Reação imediata
A
fala de Eduardo foi refutada por parte das lideranças políticas
brasileiras. O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), ressaltou
que a fala do deputado é passível de uma denúncia criminal.
“Manifestações como a do senhor Eduardo Bolsonaro são repugnantes, do
ponto de vista democrático, e têm de ser repelidas como toda a
indignação possível pelas instituições brasileiras”, disse. E seguiu: "A
apologia reiterada a instrumentos da ditadura é passível de punição
pelas ferramentas que detêm as instituições democráticas brasileiras.
Ninguém está imune a isso".
O ministro Marco Aurélio Mello, do Supremo Tribunal Federal, disse ao jornal Folha de S. Paulo,
que os ares democráticos estão sendo levados embora. “A toada não é
democrática-republicana. Os ventos, pouco a pouco, estão levando embora
os ares democráticos”.
Presidente do Senado e do
Congresso Nacional, Davi Alcolumbre (DEM-AP), emitiu uma nota para dizer
de maneira genérica que “é um absurdo ver um agente político, fruto do
sistema democrático, fazer qualquer tipo de incitação antidemocrática”.
Não citou o nome de Eduardo Bolsonaro no documento, mas citou que não é o
momento para retrocessos no Brasil. “Não há espaço para que se fale em
retrocesso autoritário. O fortalecimento das instituições é a prova
irrefutável de que o Brasil é, hoje, uma democracia forte e que exige
respeito”.
Nem mesmo o partido de Eduardo, o PSL, apoiou
sua fala a favor do AI-5. Em nota assinada pelo presidente da legenda e
agora desafeto da família Bolsonaro, o deputado Luciano Bivar, a sigla
repudiou com veemência o discurso. “O PSL é contra qualquer iniciativa
que resulte em retirada de direitos e garantias constitucionais. Em
nosso partido, a democracia não é negociável”. Internamente, a fala de
Eduardo pode acelerar o processo de expulsão dele da legenda, conforme
apurado pelo EL PAÍS.
O líder do PSL no Senado, Major
Olímpio Gomes, avaliou que a fala é uma manifestação isolada de um
deputado e que não deve se repetir entre os demais membros do Congresso.
“O Brasil carece justamente da ampliação da democracia, do respeito ao
contraditório”, afirmou. Já Coronel Tadeu, deputado pelo PSL de São
Paulo, tratou a defesa do AI-5 como algo “inimaginável”. “Se houver
radicalização, perturbação da ordem pública, é preciso combater com
energia. O ato institucional de 1968 não cabe mais hoje. É preciso
buscar o entendimento e a convergência de ideias. A democracia está aí
para isso”.
Os presidentes do MDB e do Cidadania emitiram
notas em que condenaram as declarações de Eduardo. Afirmou Baleia
Rossi, do MDB: “Consideramos inaceitável qualquer menção a atos que
possam colocar em risco, de novo, a liberdade do cidadão brasileiro”.
Enquanto que Roberto Freire, do Cidadania, assinou uma nota ao lado do
deputado Daniel Coelho e da senadora Eliziane Gama, na qual eles
trataram a declaração do deputado de “ignóbil”. “Suscitar o Ato
Institucional número 5 demonstra desprezo, desconhecimento e ignorância
sobre o que é o Brasil do século 21”.
O PSOL por sua vez
disse que apresentará um pedido de cassação do mandato de Eduardo junto
ao Conselho de Ética da Câmara e uma notícia crime no STF. O partido
entende que o congressista infringiu a norma que preza pelo decoro
parlamentar ao desprestigiar o “aprimoramento e valorização das
instituições democráticas”. Já a queixa ao Supremo será feita porque, ao
fazer apologia da ditadura militar, o filho do presidente Bolsonaro
infringiu dois artigos do Código Penal, o 286, que trata da incitação ao
crime e o 287, que trata da apologia de crime ou de criminoso. Um outro
grupo de parlamentares, vinculado ao Cidadania também deve apresentar
um pedido de cassação de mandato.
A presidente do
diretório nacional do PT, a deputada federal Gleisi Hoffmann, cobrou que
o Ministério Público e o Supremo Tribunal Federal punam seu colega
parlamentar. “Declaração de Eduardo Bolsonaro é criminosa, contra a
Constituição e a democracia”, disse em sua conta no Twitter.
Em
nota, o líder do PSDB na Câmara, Carlos Sampaio, afirmou que a
democracia e as instituições devem ser defendidas por todos. “É um
comentário que afronta a democracia, agride o bom senso e que não ajuda
em nada o país neste momento em que estabilidade política é essencial
para avançarmos nas discussões que são importantes para o país.
Informações de El Pais. Imagem: Reprodução.
Informações de El Pais. Imagem: Reprodução.